Hoje enquanto limpava a casa, percebi que não havia descido as cadeiras desde a última última limpeza. Há três delas na minha cozinha, uma perdi na mudança e só me dei conta, quase um mês depois.
Analisei e decidi: não descerei mais as cadeiras. Sei, pode parecer drástica, mas garanto ser bem fundamentada tal medida.
Nessa casa, moro sozinho e até onde sei, possuo apenas um traseiro. Portanto, não irei me desgastar nesse sobe e desce, não mais repetirei esse cotidiano ritual de invocação.
A decepção tem sido constância em minha vida. Falta de sorte ou excesso de esperança? Na dúvida, não vou mais esperar, nem desesperar. Se acaso pareço desesperado, é engano. Concerto e me assumo, des-esperante.
Não esperar, não vou tomarei meu chá com vista para espaços vazios e não terei mais objetos que me atrapalhem andar. Na minha vida só cabe o que me é útil.
Se por ventura, um dia eu acorde e decida por mim e comigo mesmo, sentar nas tais cadeiras, o farei. Uma de cada vez, duas a duas, as três simultaneamente! Na minha casa sou eu quem decide, afinal tudo sempre foi uma questão de "mim" , eu é que teimosamente insistia nesse "nós", como se de alguma forma eu pudesse atar com nós " você" à esse meu sempre solitário "eu".
Na mesa da cozinha havia quatro cadeiras, eu comia sozinho. Perdi uma e ainda sim, comia só. Hoje possuo três cadeiras toscamente empilhadas no canto ao lado da pia, pois hoje eu como só, e sobre a cama.
sábado, 28 de setembro de 2013
quarta-feira, 25 de setembro de 2013
Nas Dunas do Tempo
Era
quase noite e o dia descansava consolado pela escuridade que a noite lhe
ofertava. A areia ainda estava quente sob meus pés e o vento, contrariamente
frio, a soprava com natural suavidade contra meu rosto. À minha frente dunas se erguiam grandiosas cintilando sob uma última chama solar que ainda
resistia aos encantos da amante.
Areia. O vento a sopra moldando monumentos. Ele, servo e devoto, obedece a maior e
imutável das leis, o tempo. Um deserto é a instabilidade artística do vento,
onde ele sopra, leva, surge, finda e começa. No deserto ele cria e o tempo se
torna tão palpável quanto fugaz, tão vivo quanto poente... a areia que baila ao
som dos séculos, faz do deserto um quadro vivo da temível força da mudança.
Como
uma flecha cravada no coração do mundo, surge há alguns metros uma grandiosa
pirâmide triangular em meio a areia. A estrutura
que a principio parecia lisa e bem acabada, se mostrou com a proximidade,
disforme amontoado de rochas escuras. Uma meia lua vermelha se erguia no céu que,
cravejado de estrelas, iluminava o dorso das gigantescas dunas no horizonte,
fazendo do deserto um mar revolto e congelado.
A
cavidade por onde entrei, tornou-se progressivamente um corredor escuro de onde
eu pude perceber ao longe uma ligeira iluminação, que imediatamente me
despertou singular curiosidade. No fim do corredor duas enormes colunas
vermelhas marcavam o portal para um grande salão ricamente iluminado por
inúmeras tochas acesas sobre suportes dourados nas paredes e teto. Um grande tapete
cobria o chão traçando um caminho que dava e a um gigantesco trono que
cintilava vivamente sob a luz do fogo.
Caminhei
lentamente analisando o ambiente. Minha cabeça fazia mil especulações a medida
que os olhos e sentidos se embriagavam da beleza e magia ali existentes. Andei
cauteloso sobre o adornado tapete seguindo seus desenhos e escritos antigos
cujo significado eu ignorava.
Fui
subtraído de meus pensamentos por um sutil ruído vindo do elevado onde se
encontrava o trono. Caminhei atento até o local. O ruído me pareceu um choro.
Me assustei quando vi a pequena silhueta encolhida atrás do grande trono. Um
garoto que ao meu julgamento não passava de nove anos, resmungava baixinho com
os braços cruzados em volta das pequenas pernas. Me aproximei devagar e, num
gesto quase que materno, levei a mão em direção aos seus cabelos, mas antes
mesmo que pudesse toca-lo, ele escancarou olhos e boca num grito agudo e
assustador encolhendo-se novamente logo depois. Assustado, pensei em correr, fugir... mas ao mesmo tempo não julgava correto deixar aquela criança sozinha.
Olhei de cima do altar para o tapete e agora
seus símbolos tomavam uma única e concreta forma de um homem, pude distinguir a
letra “Q” gravada numa pulseira larga e bela no braço esquerdo da figura.
Distraído com a imagem, mal percebi a movimentação do garoto que agora estava
sorrindo de pé sobre o trono. O sorriso brilhava tanto quantos seus olhinhos
negros de ônix. Ele me olhou com carinho e então abriu os braços num gesto
todo infantil e despreocupado. Me aproximei e os bracinhos se fecharam em
torno do meu corpo num abraço quente.
Andamos por toda a pirâmide, ele me mostrava
os objetos dourados e me narrava histórias descritas nas paredes. Ele me trouxe
numa taça de cobre, uma bebida vermelha de aroma férreo e sabor adocicado que
bebeu sem pressa enquanto me falava sobre a vida e sobre o viver. Tinha sempre
num tom suave e amigo, falava animadamente de coisas bobas e triviais e fechava,
com sentimento, os olhos quando lhe vinha à mente alguma boa lembrança.
Nos
sentamos num grande sofá de cor amarelada olhando para o teto, graves como quem
aguarda o recente sabendo o que dele esperar. O fogo nas tochas aos poucos fora
minguando e não sei em que momento, adormecemos. Um período que me pareceu demasiado
curto se passou até que acordei. A penumbra era ferida sistematicamente por um
pequeno feixe de luz que a invadia o local por entre as rochas. Os olhos do
garoto se abriram repentinamente e ele me olhou assustado e choroso. Tentei
acalma-lo, porém sem sucesso. Então, num gesto que era só aflição, ele me
apontou o tapete pelo qual passei na noite anterior. Como me pareceu injustificável
permanecer em tal vislumbre, me virei novamente para ele e o que vi me emudeceu
de imediato. À medida que o sol tomava o ambiente, o garoto se transformava,
como se os anos se contassem em foto-partículas, ele envelhecia sob a luz
dourada.
Com
o olhar sofrido e pesaroso ele levou sua mão em minha direção no intuito de me
afagar, foi quando a manga de sua túnica cedeu ao peso do tecido deixando ver
um belo adorno em seu pulso, que principio não percebi, mas logo reconheci em
susto que se tratava de uma bela pulseira de cobre com uma letra gravada.
Minha consciência correu desorientada pelas memórias da noite anterior
procurando um sentido ou lógica no que via.
O
homem que se estendia ao meu lado então se levantou silente e calmo, caminhou
até o trono dourado e antes de se sentar, colocou sobre a cabeça uma coroa
verde com uma cobra de ouro na fronte. Também me levantei e sem entender bem o porquê,
me ajoelhei à sua frente de cabeça baixa.
Um
momento depois quando por fim ergui meu olhar, o trono estava vazio e o silêncio
imperava. Resignado, caminhei em direção à imensidão arenosa que resplandecia sob
o sol. Já fora da pirâmide, senti um olhar às minhas costas, meu semblante
então converteu-se num sorriso tranquilo e feliz. Fechei os olhos e pedi ao
vento que tocava em meu rosto, que soprasse minha prece ao tempo, desejando que
ele mova as dunas, que ele mude as verdades e a vida e que em algum lugar
desse sofrido deserto, meu oásis de pedra tome vida e me proteja do calor da
caminhada e da sede de amor.
terça-feira, 24 de setembro de 2013
Estrelas e sorvetes
Te chamo de criança
Te deito em meu colo
Aponto algumas estrelas
E te conto histórias sobre elas
Veja o quanto estão longe
Ainda sim podemos ver que brilham,
É assim nossa felicidade, meu pequeno
Se levante de pés descalços
Sinta a brisa, ouça os grilos
E feche bem seus olhos
Verá surgindo no horizonte
A luz de uma felicidade
Colorida como os sorvetes
Que vem derretendo todo passado de flocos escuros
Eu te envolvo em meus bracos
Embalando suavemente seus sonhos
A relva cintila sob nossos pés
Então sentimos mais uma vez
O calor do abraço, do carinho e do sol.
Te deito em meu colo
Aponto algumas estrelas
E te conto histórias sobre elas
Veja o quanto estão longe
Ainda sim podemos ver que brilham,
É assim nossa felicidade, meu pequeno
Se levante de pés descalços
Sinta a brisa, ouça os grilos
E feche bem seus olhos
Verá surgindo no horizonte
A luz de uma felicidade
Colorida como os sorvetes
Que vem derretendo todo passado de flocos escuros
Eu te envolvo em meus bracos
Embalando suavemente seus sonhos
A relva cintila sob nossos pés
Então sentimos mais uma vez
O calor do abraço, do carinho e do sol.
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