De alma suada e pés feridos da caminhada, ele se sentou. Não
como quem descansa, esse sentar era antes uma espera.
Com a fronte plácida e tranquila, ele debruçou com
delicadeza seu olhar no horizonte, onde um mar dourado cintilava da alegria que
o sol lhe salpicava.
Como quem percorrera todo um mundo de dificuldades e
sofrimentos, ser terroso que sempre fora, buscava ao longe algo que ele mesmo
não sabia nomear. Talvez apenas buscasse sem lhe importar o quê. Buscava um não encontrar, a ausência desse sufocante todo.
O coração sussurrava no peito: Eu quero ir embora. Embora
de todos os lugares onde já estive.
Pra ele, sempre fora difícil partir. Ele que sempre
permanece, que nunca vai ou abandona. Ele que com esse seu eterno ficar deixara um pouco de si em cada pedra pontiaguda da estrada, em cada poça
lamacenta em que caíra. Tornara-se uma criatura repetidamente diluída no
despropósito de viver.
Com mãos erguidas acima da cabeça, como numa prece
silenciosa e sofrida, pediu ao céu que até agora esteve indiferente às
atrocidades desse mundo, que lhe abençoasse com a água que dele cai. Diamantes líquidos em forma de chuva. Esperava que tal chuva levasse consigo
seus pedaços perdidos pelo mundo e os entregasse aos rios onde águas vivas e
fortes pudessem desagua-los nesse mar que lhe afrontava.
O oceano, vestia sua mais bela túnica dourada
pelo sol e seu reflexo dava aos olhos do garoto uma vivacidade fugaz, porém
genuína.
Sentado ali de pés semi-cobertos pela areia ainda aquecida
pelo dia, ele com o mais lânguido dos olhares afrontou com um quase cinismo o
gigante azul dourado: Você que principia e termina desse chão que piso.Por que tu, mesmo tão grande e forte, permanece? Por
que não invade, toma tudo? Por que não me leva contigo?
Apenas uma leve brisa arriscou um palpite.
Ela lhe soprara verdades infundadas de uma realidade
improvável.
O mar adentrando seu mundo, alagando sua vida. Tudo úmido e
frio. Todas as convicções, crenças e verdades boiando soltas, batendo umas
contra as outras. Algumas afundam, outras a correte leva. Nada é certo. Tudo
muda, se move, aparece e some, assim como ele sempre vive e também morre.
De súbito, como num redemoinho reverso, ele é lançado fora
de si e de suas divagações.
O mar, audacioso e soberbo se mostrava agora com um manto da
mais gélida cor azul, quando cheio de uma autoridade de força suprema e perene,
ele soube se comunicar com o garoto, de uma forma só deles: Esqueça. Entenda a
grandeza que existe no aceitar, a força da resignação. Não cometa o
sacrilégio da revolta contra si. Pois o ganhar reside no se dar, bem como o ser se consegue deixando de existir.
Bebendo dolorosamente tais palavras que arderam com a acidez
que só possuem as verdades imutáveis, ele afundou.
Afundou tanto que quando tocou o solo, estava dentro de si.
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