A mão escreve trêmula
O peito infla soltando ruidosamente o ar
A boca rígida aperta e range os dentes
O olhar duro racharia o ar se ele fosse sólido
Você é esse gosto ruim
É aquela gosma no fundo da garganta depois do azedo
Eu te cuspo
Te escarro
Você é quem preenche o vazio do meu peito
É sua a agonia que sopra minhas narinas
Você é a dor do ódio
É a mágoa que me mancha de negro
Onde acaba o amor
E começa a destruição?
O que difere esse viver
Da morte ininterrupta?
Eu quero que vá!
Quero mesmo que a terra se abra em dentes
E que, escancarada, te devore pra sempre
Não me pesaria ver seu sorriso sangrar para as pedras
Oh, então saia!
Nada de cigarros pra mim
Meu veneno eu mesmo produzo
Te morderia se isso o matasse
A morte te faria eterno
Tal vulgaridade de ser precisa ser extirpada
Que não se propague pelo mundo
Esse pecado atroz
Eu odeio o cinza
A cor me enoja
Seja negro, seja alvo
Mas tire da minha vista esse seu cinza!
Não se mostra por medo
Se vende caro ao que é banal
Saia detrás desse seu azul roubado
Assuma sua imundície de alma
Cuspa na minha cara
Grite algo no escuro
Mas não molhe de lágrimas sua face
Não me consola seu choro
Porque chora, criança?
Prefiro que sangre esses seus olhos
Talvez assim enxergue a cor em mim
E veja o mundo como eu
Me deitei numa cama de negros escorpiões
Me satisfiz e esperei deles amor
Mas como esperar que floresça
No deserto alguma rosa
Você está seco!
Sua muralha se desfaz com o vento
Pois até os maiores castelos
Tornam-se ruínas com o tempo
Toda fortaleza se ergue sobre solo arenoso
Terra encharcada por lágrimas alheias
Toda mágoa sofrida
Cada pequena gota é por você
Cairá do céu escuro
Mágoas líquidas
A enxurrada será impiedosa
E de você não restará lembranças
Não haverá quem chore
No céu o azul legítimo sustentará sobre nós a luz do sol
Fazendo lembrar que não há noite ou dilúvio
Que assole a força de um coração que ama.
Nenhum comentário:
Postar um comentário