Pois aconteceu de então, de numa madrugada escura,
o Sol ir embora.
No primeiro dia eu estranhei a falta. A ausência do
astro alterara minha própria órbita. Seu calor tornava-se cada vez mais ameno e
meu corpo se arrefecia refém da distância.
No segundo dia eu estive feliz e sorri por ele.
Agora ele estava mais do que nunca no céu e brilhava solitário e austero sobre
todos.
O terceiro dia se iniciou lânguido e displicente
tendo água e sombras como cúmplices. Olhei pra cima e nada vi, meu Sol agora
reluzia distante, aquecendo a grande selva de pedra,pairando sobre cabeças
vorazes que gritavam clamando por chuva.
O quarto dia foi ainda mais frio e o cinza mórbido
que pintava a cidade dava à ela uma nota de fúnebre melancolia. Eu, tal como as
nuvens lentas quase estáticas no céu, diminui o ritmo até adormecer. Dormi,
dormi... e quando de olhos abertos ainda dormia. Cansaço, tristeza, frio,
saudade... menos fome. Mas tal como a terra anseia o calor, o Astro Rei não se
compraz em queimar sozinho.
No quinto dia eu amanheci com a chuva, que
revoltada, afrontava o vidro da janela sobre minha cabeça. O mundo era caos, porém
mesmo assim eu resolvi sair. O Sol imperara até então, porém ele não faz parte
desse mundo. Portanto e para tanto: Vivi, refiz, criei e inventei! Modifiquei
as formas e modos do mundo que me restou. Eu nada tenho além do hoje.
No sexto dia, como se ele também sentisse falta do
sol e o gelo da indiferença também o ferisse, o céu sangrou. Sangrou minhas
pequenas e agudas mágoas, sangrou minha insegurança tão sofrida... Ele sangrou
vermelho, pois mesmo que doa, é amor. Tal dissonância de tons no céu, esse
vermelho aquecendo liquidamente o mármore cinza, trouxe-me displicentes
lembranças, tão quentes e distantes quanto meu Sol.
O sétimo dia me pareceu menos frio. A rubra nuvem
de outrora se dissolvera entre as outras, dando um tom róseo à cúpula celeste.
Como se fosse eu a terra, senti amanhecer em meu peito o calor. Tudo se
iluminava, as formas se revelavam, o que era úmido secava sublimando todo choro
frio da grande noite. O mundo me sorriu feliz. Me sorriu como um pai que se
orgulha do filho que levanta enxugando as lágrimas após a queda.
No fim da grande noite eu decidi enfim descansar. O
corpo lacerado se recompunha no calor tão desejado e o coração batia alegre no
velho peito. Nada começa ou finda. Marés, astros, vidas... são ciclos. Exceto o
tempo. E eis que Ele, tão perene quanto fugidio, fez da grande noite uma
regênesi de mim. Há sete dias, eu amanhecia como um homem no escuro, porém
hoje, eu me ponho como o sol do meu próprio horizonte.
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